domingo, 22 de outubro de 2017

Memórias de Espinho em azulejo

COMO PRESERVAR AS MEMÓRIAS DE ESPINHO ANTIGO EM AZULEJO

Espinho festejou um "jovem centenário", em 1989, com a inauguração dos belos quadros de azulejo que, na rua 19, passaram a encimar a entrada e ornamentar os acessos ao túnel do comboio. Uma feliz iniciativa da Junta de Freguesia, que assim nos ofertava uma espécie de pequeno museu dos seus lugares históricos, em tradicional azulejaria, permitindo-nos viajar no tempo até às suas origens oitocentistas.
Depois, o enterramento da linha significou o enterramento dessa esplêndida galeria de memórias, da qual só resta, bem visível, mas não sabemos por quanto tempo, a sugestiva imagem daquele mesmo lugar, quando ainda havia comboio à vista, e a singela ponte sobre a linha férrea a ligar os dois troços da rua principal, e quando  os edifício mantinham ainda a seu harmónico  traçado do início do século XX..
Podem chamar-me saudosista - aceito que o sou. Não exatamente dessa época, mas do que dela restava nos anos 40 e 50 do século passado: a linha à superfície, a ponte sob a qual as máquinas a vapor, magnificamente negras, lançavam baforadas de fumo escuro (coisa fascinante de contemplar de perto para criança da minha idade), o quiosque, a avenida cosmopolita, que agora é só relva e alcatrão, à espera do projeto de futuro, que tanto tarda.
 Na verdade, tenho de confessar que fui sempre contra a obra grandiosa e cara do enterramento da linha, mesmo que ela fosse, como deveria ter sido, alargada a todo o espaço central da cidade, desde o Rio Largo ao bairro piscatório, e não apenas a umas centenas de metros.
Bem mais económica e original teria sido, a meu ver, a construção de mais umas pontes, de preferência, esteticamente vanguardistas, e de um ou outro túnel, de norte a sul de Espinho...  Estarei, porventura, sozinha neste meu apego à fisionomia de uma cidade da qual o comboio era matriz, tal como a arte xávega, o oceano de ondas fortes, ou a sua vocação cosmopolita.  O comboio era um mensageiro da sua singularidade, meio ideal  de evidenciar a inúmeros de passageiros, todos os dias, a convivialidade da avenida 8, com mar em pano de  fundo, as majestosas palmeiras, as esplanadas, o movimento festivo de muita gente.  Nos trezentos quilómetros do trajeto Porto/ Lisboa era a parte mais interessante, mais atrativa. Hoje é precisamente o contrário, os clientes da CP atravessam a cidade sem a ver, por um longo túnel escuro, feio e claustrofóbico, com uma teto de cimento. permeável ´humidade e a infiltrações,  de tal ordem, que, não raramente, colocam baldes de plástico a apanhar as gotas de água que tombam sobre o cais - cena autenticamente terceiro -mundista. E nem sequer se dignaram destacar o nome de Espinho na massa uniforme das suas paredes... 
Por tudo isto, pareceria evidente o destino dos belos azulejos; a estação! Para decorar as longas paredes do túnel, onde cabem todos os que existem e onde se pode acrescentar muitos mais. Espaço despido e incaraterístico é o que não falta. Assim haja a vontade de embelezar o cinzentíssimo subterrâneo  com o nome e as imagens de Espinho, antigo e moderno, para que os passageiros do comboio se apercebam que estão a atravessar uma cidade e possam levar consigo vislumbres do que foi, e é, a urbe que vive lá em cima..
(publicado na DEFESA DE ESPINHO, 19 de outubro)

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