domingo, 29 de outubro de 2023

ANA DEL RIO NO FACE

A inauguração da exposição individual de Ana del Rio nas galerias do FACE – o Fórum de Arte e Cultura de Espinho – é um acontecimento maior na vida de Espinho, no ano em que se comemora o cinquentenário da sua elevação a cidade. A Artista, com uma seletiva retrospetiva do seu percurso de mais de três décadas pelo universo encantatório da representação pictórica, vem dar-nos a visão evolutiva da sua obra tão esplendidamente multifacetada e, em simultâneo, enriquecer o registo cultural, o percurso do próprio FACE. As galerias Amadeo Sousa Cardozo são, pela dimensão e harmonia arquitetónica dos seus dois longos e luminosos salões geminados, um dos mais convidativos espaços de exposição de Artes plásticas no nosso País. São, também, um dos mais prestigiados por grandes nomes nacionais e internacionais, que, como Ana del Rio, agora, com a marca do seu talento, fizeram e fazem a História ainda breve, mas já extraordinária, de uma instituição jovem. Uma história que pude acompanhar de perto, quase desde o início e, por isso, tanto me regozijo com mais este passo na sua ascendente caminhada cultural, como com a presença de uma artista tão querida e admirada pela força emotiva que, invariavelmente, emerge no seu trabalho, e por uma incansável procura de transcendência de limites, inerente ao seu inconformismo, carisma, vivacidade. Na tela, como na vida quotidiana, fala a Mulher, a cidadã, a feminista, a militante de causas. Esperava, há muito, este momento, que é, para mim, o do retorno da pintora ao local onde a conheci, durante a 1ª Bienal de Mulheres D’Artes, realização inédita em Portugal, ao que cremos, na Europa, com que FACE escreveu um capítulo original nos anais do feminismo, no domínio particularmente relevante da sua expressão cultural e cívica. Ana del Rio foi, de entre essas pioneiras, uma das que mais me impressionou. Guardo na memória as imagens de três telas figurando mulheres que encarnavam, na perfeição, o espírito daquele projeto - personagens irradiantes de feminilidade e força anímica, que, ali, num movimento assertivo e gracioso, tomavam conta do lugar que lhes era destinado, humanizando-o, (ou seja, feminizando-o). Uma mensagem subtil e promissora, a significar que, no nosso tempo, a pintura pode converter-se numa outra maneira de dar às mulheres o reconhecimento que merecem, na afirmação pela Arte. O FACE tem dado abundantes provas de compreensão do fenómeno e de vontade de contribuir para o aumento da participação feminina num campo onde, como nos demais, a igualdade de género não está ainda adquirida. Nas exposições coletivas, nas sucessivas Bienais, (atualmente abertas aos dois sexos), a paridade tem sido sempre conseguida. Não, porém, nas exposições individuais, onde escasseiam as mulheres com currículos e com telas à dimensão da (quase) desmesura das Galerias… Ana del Rio é uma das mais esperançosas e inspiradoras exceções a essa regra ou cânone misógino que atravessou os séculos e vai cedendo, tão devagar e, porventura, mais na aparência do que na realidade. E, assim, o mundo de Ana del Rio se apropria e se expande na vastidão deste espaço, reconfigurando-o pela beleza estética e pela mensagem humanista. O mundo de Ana del Rio! De tudo o que ela ama e de tudo o que ela nos quer contar, no traço em que dá vida a flores e a pássaros, ´natureza, ao perfil das cidades, a rostos e a vultos que sobressaem ou quase se escondem em explosões de luz e de cor - ou em que a sua mão nos conduz à esfera onírica e enigmática do abstracionismo. Um mundo, aqui e agora, partilhado connosco, para livremente recriarmos e revivermos nas nossas próprias emoções. Maria Manuela Aguiar

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