Recordar tempos idos... Falar do presente, também. E até, de quando em vez, arriscar vatícínios. Em vários domínios e não só no da política...
domingo, 6 de março de 2016
1978 NO 16º ANDAR DA PRAÇA DE LONDRES
Nos meus cerca de 7 anos de trabalho no arranha céus da Praça de Londres, poucas vezes tive de subir ao 16º andar, o do Poder - duas, três, já nos últimos tempos, com o Ministro Silva Pinto e o Sub-secretário de Estado Nogueira de Brito (um antigo colega do 1ºandar - ou seja, do Centro de Estudos).
Como corriam histórias assustadoras de avarias dos elevadores, elevadores que fechavam hermeticamente (símbolo de modernidade), sempre considerei uma bênção ter um local de trabalho acessível através de uns poucos degraus de escada.... O diálogo com o Poder era ofício do Diretor do Centro de Estudos, pelo que todos os dias eu via os elevadores, situados no átrio, mas não os utilizava.
Depois da revolução aquele Ministério cindiu-se em dois, Trabalho e Assuntos Sociais, Optei por este último, ao tempo com Pintasilgo por Ministra, e passei 4 anos longe do magnífico edifício, dividindo a minha semana entre consultadoria nos gabinetes da R João Crisóstomo e a Faculdade de Direito de Coimbra, onde dava aulas à 2ª feira (e, talvez, também à 3ª feira - já não sei com precisão). Até que passei, geograficamente falando, para a Av 5 de outubro, onde fui "estrear" a Provedoria de Justiça, com o 1º Provedor, Coronel Costa Brás.
Costa Brás é uma das figuras mais importantes do pós 25 de abril - um verdadeiro operacional das primeiras eleições democráticas, Foi ótimo estar sob as suas ordens: era sério, competente, rápido a decidir, e a decidir bem. Na entrevista que tive com ele, alertou-me para o carater "burocrático" de muitas das diligências que ali se faziam, e que ele achava pouco interessantes para quem vinha de uma Universidade, mas eu reiterei a vontade de "mudar de vida". O "ombudsman" é uma instituição de criação nórdica e para mim, na altura, tudo o que era sueco era ótimo. Queria experimentar!
Por sinal, dei-me bem, apesar das saudades de Coimbra.
Ao Coronel Costa Brás. sucedeu o Dr José Magalhães Godinho. Que sorte eu tive de ser uma das suas assessoras!
Todos os meus "chefes", em diferentes cargos da função pública, foram excecionais e alguns tornaram-se grandes amigos.
O maior de todos foi o Dr Godinho!
Embora politicamente muito distante do Governo a que eu ia pertencer (o do Prof. Mota Pinto), estava feliz por mim, e insistiu em me dar "boleia" para a tomada de posse. Com ele fomos e regressamos da sessão solene, a Camila, a Branca e eu - isto é, a minoria feminina do corpo de assessores do PJ.
Nunca gostei daquele género de sessão solene, senti-me sempre intimidade, então e, depois, em mais quatro posses futuras. Não sei porquê... As luzes, o rígido protocolo, os olhares da distinta assistência...enfim, o "medo do palco" traduzindo do inglês, "stage" - pelo visto coisa comum a grandes vedetas do teatro e a pequenas Secretárias de Estado.
Recordo que vestia um tailleur simples e levava um colar de pérolas,
No regresso, já descontrída, tirei as pérolas, atirando-as, descuidadamente, para dentro da carteira,
A Camila ficou aflitíssima:
- "Não faça isso. Vai estragar as pérolas!"
- "Não faz mal, são falsas!" respondi. De facto eram, embora não parecessem.
Deixaram-me à porta, na Praça de Londres. A partir daí, estava por conta própria, On my own... Queria ter continuado, de volta "a casa". Sentia-me só, perante o desconhecido... O 16º andar.
Espinho, 4 de março 2016
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