quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O DR CARLOS de LEMOS EM ESPINHO

“HISTÓRIA DE UMA VIDA” O HOMEM E O LIVRO Tem estado entre nós, desde Setembro, um dos casais portugueses mais cosmopolitas e mais viajados que conheço - o Doutor Carlos Pereira de Lemos e a Doutora Molly Murray de Lemos, emigrantes na Oceânia há largas décadas. Ele tem 90 anos, ela é mais nova, mas da mesma geração. Recentemente, ela recebeu uma honraria rara, a Ordem da Austrália, pelos seus trabalhos de investigação e ele, em Dili, as insígnias da Ordem de Timor - Leste, pela sua incansável intervenção diplomática em favor dos timorenses Nesta visita a Portugal Carlos de Lemos trouxe consigo uma autobiografia, que apresentou em vários lançamentos, de Lisboa a Melgaço, num vai vem constante, a partir de Espinho. Nada a que não esteja habituado - de movimento se fez " a história de uma vida", que parecia condenada ao confinamento em pequenos povoados serranos do Alto Minho. O Homem Carlos de Lemos quase não teve infância - saiu da escola com a 3ª classe e logo precisou trabalhar, como um adulto. A partir dos 12 anos ficou entregue a si próprio e as grandes decisões, que o conduziram a um destino prodigioso, foram da sua inteira responsabilidade. O perfeito exemplo de "self made man" que chegou longe - mas não no tipo de sucesso que geralmente se associa ao conceito: o sucesso material, a fortuna contabilizada em milhões. Não era isso o que procurava. Queria ir longe no sentido literal de abrir horizontes geográficos, mas também os horizontes do conhecimento e da Cultura. .Ele mesmo o afirma no epílogo da autobiografia: "Não acumulei dinheiro. Mas acumulei riqueza de ter vivido uma vida cheia de experiências variadas". Sozinho vai para a cidade. É empregado de café em Melgaço, depois em Monção. Já aí um dos doutores, cliente diário do café, lhe diz: "Rapaz, tu és um verdadeiro diplomata". E diplomata viria a ser, muito mais tarde…Na etapa seguinte está Lisboa e Cascais. É adjunto de topógrafo - um jovem bem parecido e simpático, facilmente aceite em tertúlias de universitários e de intelectuais. Discretamente, aí vai a exame da 4ª classe. Como topógrafo, palmilha o País, de lés a lés. Espinho, a Póvoa, são parte do seu roteiro. Na Póvoa, num só ano, completa o antigo 5º ano do liceu. Em todo o lado, convive e dialoga à vontade com elites da cultura. Está pronto para "correr mundo", até ao limite das fronteiras de um "império" (que entrava na sua fase derradeira), "do Minho a Timor".Primeiro, Moçambique - o vale do Limpopo, com esporádicas visitas à capital, onde frequenta o seletivo "Clube de Lourenço Marques"). E conta no seu círculo João Maria Tudela, Paulo Vallada, e... Samora Machel. Com as poupanças amealhadas, tira licença sem vencimento, não para se divertir, mas para estudar em Universidades da África do Sul. Quando o pecúlio se esgota procura nova ocupação, ainda mais longe. É o novo topógrafo -Chefe no projeto de construção do porto de Dili. Anos felizes, já com a Mulher. Molly, por quem se apaixonara nos bancos da Universidade. Na África do Sul pertencera ao "inner circle" de Alan Paton (cujo filho era colega). Na sua casa encontra outros famosos oposicionistas ao "apartheid", como Tambo, Mandela e Sisulu. Em Timor, o especial amigo é Rui Cinatti. Um novo capítulo se inicia, quando a carreira académica de Molly os atrai à Austrália. Serão, doravante, emigrantes. Como topógrafo, ele atravessa os desertos do norte australiano, por terras que ninguém tinha ainda pisado. Melbourne é a cidade onde, por fim, se enraízam. Molly prossegue a carreira académica. Carlos de Lemos, depois de terminar os cursos de Sociologia e de Ciências Políticas, é professor, correspondente de bancos portugueses. Um cidadão ativo na emergente comunidade portuguesa, que lidera e mobiliza. Cria a escola de português, o programa de rádio, a "comissão" de atividades sociais e culturais. Antes de ser, formalmente, acreditado como Cônsul Honorário (em 1988), já era o defensor natural dos imigrantes portugueses - e dos timorenses!. O seu prestígio e capacidade diplomática convertem-no no mais notável paladino da cultura e da história portuguesas em toda a Austrália. Consegue o "impossível" - erguer um padrão de homenagem aos navegadores portugueses em Warrnanbool, onde terão aportado as caravelas lusas, 200 anos antes de Cook.. Kenneth Mc Intire, o investigador que comprova a primazia da descoberta portuguesa, é visita assídua de sua casa. .Warrenanbool recebe, desde então, muitos milhares de turistas, sobretudo por altura do "Portuguese Festival", que, por iniciativa do nosso Cônsul, aí se realiza anualmente Converteu-se, assim, em autêntico "lugar de culto" para a nossa gente e para muitos australianos. A cidade agradeceu, dando a uma das ruas, o nome do Dr Lemos. O Presidente Sampaio distinguiu-o com a comenda da Ordem de Mérito. O Livro É uma narrativa fantástica da aventurosa trajetória deste Homem extraordinário, a mostrar mais um dos seus talentos: escrever num português límpido, simples e expressivo, que nos encanta e nos desafia a ir com ele pelo mundo fora, numa viagem que atravessa épocas, mares e continentes. É uma partilha de memórias, de confidências, de observações e comentários sobre muitos lugares e pessoas, com imenso interesse antropológico, histórico, sócio - político. É o retrato de um português de hoje que encarna, realmente, as virtudes que atribuímos aos antigos portugueses – a atracão por outras terras, outros costumes, o dom de conviver afetivamente com outros povos. É o retrato de um emigrante que soube "dar um sentido humanista e fraternal ao movimento incessante da sua vida" - cito palavras finais do meu prefácio, que é seguido por três mensagens, de personalidades dos países a que ele, de facto, pertence. Por Timor fala o Dr. Ramos Horta, reconhecendo que: "A sua tem sido, e sei que será, uma vida de serviço prestado à causa de Portugal, dos Portugueses e dos Timorenses". Por Portugal, o Dr. Rui Quartin Santos, antigo Embaixador em Canberra, realça "as suas qualidades humanas e profissionais, o prestígio que soube conquistar junto de portugueses e australianos". Pela Austrália, Sir James Gobbo, ex- Governador do Estado e Juiz do Supremo Tribunal de Justiça, dirige-se, sobretudo, ao diplomata: "I think particularly of your role as Honorary Consul of Portugal and your admirable leadership of the Consular Corps in Melbourne".. Aqui fica um convite à leitura de uma história de vida, que é, também, parte da história do País e de outros Países. em "A DEFESA DE ESPINHO", 27 de outubro de 2016

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